A encarnação, o ministério, a morte, a ressurreição e a ascensão são ocorrências que marcaram, de forma indelével, a vida terrena daquele que Deus enviou ao mundo. Tais acontecimentos fundamentam a fé que professamos. Todos são valores que perdurarão para sempre. Todos trazem, em si, revelações que firmam a nossa fé em sua pessoa. Neste estudo queremos destacar, o momento em que o nosso Senhor, cumprida a sua missão, deixou o espaço terreal, para penetrar no santuário celestial, fazendo-se presente junto ao Pai.
Surpreende-nos que os textos dos evangelhos, no Novo Testamento, não dão o mesmo espaço à ascensão de Jesus ao céu, que é dado à sua morte ou à ressurreição. Dois dos evangelhos, Mateus e João, omitem a ocorrência, enquanto Marcos e Lucas fazem, apenas, uma narrativa simplificada, como linhas conclusivas dos relatos feitos anteriormente. É o livro de Atos dos Apóstolos o que lhe dá mais atenção, mesmo assim, o faz em breves versículos. É estranho que um momento transcendental como esse, não seja apresentado de uma forma mais ampliada, pois, ele moveu e marcou profundamente os discípulos, de quem é dito: “Então, eles, adorando-o, voltaram para Jerusalém, tomados de grande júbilo” (Lucas 24.52).
A ascensão de Jesus tem uma alta expressão para a nossa fé, pois, cumprida a sua missão no mundo – a morte na cruz – ele retornou àquele que o enviou. A fé precisa envolver todos os momentos da vida de Jesus, desde sua encarnação até o lugar que ele ocupa na glória do Pai. Na verdade, a ascensão é um ato excepcional, pois, ela não é uma simples transição que Jesus fez do espaço físico em que estava para a esfera espiritual onde se encontra. De início, podemos dizer que a ascensão é o momento em que Jesus recuperou a tudo do qual se despojou, para fazer-se carne e estar presente entre nós. Aquele que “a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo” e “a si mesmo se humilhou” (Filipenses 2.7,8), reassume, com a maior honra, a posição que só a ele pertence junto ao Pai.
Aquele que Deus designou como o seu “Servo, o Justo” (Isaías 53.11), é, quem se despe de sua humanidade para se revestir da posição de “o grande sumo sacerdote que penetrou nos céus”, no dizer de Hebreus 4.14. Aquele que na terra não possuía um lugar para reclinar a cabeça (Mateus 8.20) é quem os discípulos vêem subindo para entrar na glória e se assentar “à destra do trono da Majestade nos céus, como ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo que o Senhor erigiu, não o homem” (Hebreus 8.1,2).
A ascensão de Jesus merece receber da igreja uma comemoração viva e de intensa alegria, pois, ela tem um lugar muito específico no plano de salvação, o qual Deus elaborou para as suas criaturas. Pois, a ascensão revela, entre outros fatos, que aquele que os homens mataram, crucificando-o por mãos de iníquos (Atos 2.23) foi exaltado à destra de Deus, por ser o seu Unigênito Filho.
O momento da ascensão, também, ajudou os primeiros discípulos a se desfazerem de toda e qualquer sombra de dúvida que, ainda, poderia perdurar em seus corações sobre a pessoa daquele que conviveu com eles como o seu Mestre. Quando Jesus lhes dirigia suas últimas palavras, o evangelista notou que: “lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras” (Lucas 24.45). Só isso seria suficiente para que a ascensão fosse comemorada por nós.
A ascensão é a aprovação de Deus à obra redentora efetivada por seu Filho. É o seu amém divino ao brado de vitória, que no meio de sofrimentos e dores da cruz, se elevou ao céu, dizendo: “Está consumado” (João 19.30). É a recompensa que o Pai concede ao Filho recebendo-o vitorioso em seu lar celestial.
O texto de Lucas elucida que Jesus,enquanto os abençoava, ia-se retirando deles, sendo elevado para o céu. Então, eles adorando-o voltaram para Jerusalém, tomados de grande júbilo; e estavam sempre no templo, louvando a Deus” (Lucas 24.51-53). “Adorando-o”, mostra uma nova compreensão que os discípulos tiveram de Jesus, agora, efetivamente, eles passaram a reconhecê-lo como aquele que é mais que um mestre que esteve com eles, era o Senhor a quem devem total obediência e fé irrestrita, como a Deus mesmo. Foi nesse momento de grande alegria que a igreja nascente assumiu, para si, a profissão de fé que Tomé fez ao reconhecer Jesus ressuscitado: “Senhor Deus e Deus meu” (João 20.28). Jesus é Deus! Amém.
Completado o resgate de nossas vidas, substituindo-nos no holocausto da cruz, derrotada a última investida do inimigo para desviá-lo de uma vitória total, quando lhe lançou o negro manto da morte, Jesus levanta-se, soberano, do sepulcro, destituindo a morte de seus poderes, colocando a todos sob sua soberania. A ascensão foi o momento em que ficou firmado, para sempre, que a fraqueza deu o seu lugar à força, o opróbrio deu a sua posição à gloria e a morte deu o seu espaço à eternidade.
Subindo ao céu Jesus não é mais o servo sofredor, humilhado e esvaziado, é o Cristo vitorioso, aprovado para ocupar novamente o trono de glória, junto ao Pai – “Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para encher todas as cousas” (Efésios 4.10). A palavra “subiu”, nos mostra que Jesus elevou-se de baixo para cima, ou seja, do lugar dos homens ao espaço de Deus. A onipotência do Pai é, agora, plenamente compartilhada com o Filho. Ainda mais, lhe foi entregue o governo sobre tudo que fora criado.
Paulo, na carta aos Efésios, assegura que Deus “segundo a eficácia da força do seu poder; o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos e fazendo-o sentar á sua direita nos lugares celestiais, acima de todo o principado, e potestade, e poder, e domínio, e de todo o nome que se possa referir não só no presente século, mas também no vindouro” (Efésios 1.20,21). Essa é a realidade do que ocorreu no retorno de Jesus à eternidade.
O “sentar à sua direita” significa: ocupar o lugar da mais alta honra onde Jesus recebeu a dignidade, a onipotência, a divindade, o poder e a glória suprema que o Pai lhe devolve. Quando o texto de Hebreus 1.3 afirma que ele: “se assentou à destra da Majestade, nas alturas” e, após, em 8.1, declara: “à destra do trono da nos céus” e, ainda, em 12.2 assegura: “à destra do trono de Deus”, ele não somente reforça a posição que Jesus ocupou após sua ascensão, como elucida que o Pai reina por meio de seu Filho, demonstrando, assim, o propósito de destacar a alta prerrogativa que Jesus passou a ocupar na glória do céu.
Como a igreja precisa ter, sempre, diante de si, a visão de Jesus glorificado! Pois, aquele que Deus o colocou por sua cabeça é, justamente, aquele que reina junto ao trono do Pai. Dele é dito: “subiu acima de todos os céus, para encher todas as coisas” (Efésios 4.10). Esse é o encargo supremo que só ele pode exercer. Aquele que a igreja – o seu corpo – tem como a sua cabeça, a sua maior autoridade, é para quem Deus faz “convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as cousas, tanto as do céu como as da terra” (Efésios 1.10). É esse Senhor glorificado que a defende de seus inimigos; quem a sustenta com seu poder e a dignifica com sua constante presença junto a ela. Apesar da igreja, muitas vezes fracassar, cair em tribulações, abandonar o primeiro amor, voltar-se para doutrinas estranhas e de “que tens nome de que vives e estás morto” (Apocalipse 3.1), há uma constante: aquele que está à direita do Deus Pai, apesar de tudo que ocorre na igreja, é quem a governa e tudo faz para que ela efetive, plenamente, a sua missão, a sua razão de ser, na terra.
O salmo 110.1, centenas de anos atrás, profetiza: “Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos abaixo dos teus pés”. Jesus usou esse salmo e o aplicou a si próprio, com um sentido messiânico (Marcos 12.35,36). Pedro o cita no dia de Pentecostes, adequando-o à pessoa de Jesus, e, após faz a contundente afirmação: “Esteja absolutamente certa, pois, toda a casa de Israel de que este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo” (Atos 2.25 -28, 34-36). Pouco antes de subir ao céu Jesus afirmou: “Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra” (Mateus 28.18). E Filipenses 2.9-11 afirma: ”Pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo o nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda a língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para a glória de Deus Pai”.
Pedro acrescenta que Jesus “depois de ir para o céu, está à destra de Deus, ficando-lhe subordinados anjos, e potestades, e poderes” (I Pedro 3.22). A introdução da carta aos Hebreus seguindo a mesma linha, mostra que Jesus “é o resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as cousas pela palavra do seu poder, depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da Majestade, nas alturas, tendo se tornado tão superior aos anjos quanto herdou mais excelente nome do que eles” e “ao introduzir o Primogênito no mundo, diz: E todos os anjos o adorem (1.3,4 e 6), e, acrescenta: “O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre” (Hebreus 1.8). Notemos que essa última citação sobre Jesus possui uma afirmação que o designa como Deus.
Romanos 8.34 apresenta uma revelação que nos conforta: “É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós”. Junto ao trono da graça – é trono da graça porque Jesus está ali, bem junto ao Pai – nessa posição ele está “vivendo sempre para interceder por eles” (Hebreus 7.25) Nessa condição, como fiel advogado, ele nos garante que “recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hebreus 4.16). Ele diligencia benefícios para aqueles que ele, como intercessor diante do Pai, representa – a quem, em profundo amor, ofertou a sua própria vida. À destra de Deus ele não ocupa somente um lugar de honra, poder e glória, mas aí, como sempre, ele continua a ser o Pastor que se ocupa conosco, pois, “intercede por nós”.
O salmo 24, que, como outros, é designado: “messiânico”, profetiza a ascensão do Senhor Jesus. Inicialmente, ele identifica os que foram alcançados pela obra de Jesus, designando-os como “a geração dos que o buscam a face de Deus”. Após, ele determina, em tom solene e forte, aos portões celestes: “Levantai, ó portas as vossas cabeças: levantai-vos ó portais eternos, para que entre o Rei da Glória”. Quero responder aqui a uma pergunta que muitas vezes me é feita: Por que do salmista usar a palavra “cabeça” ao ditar ordens às portas? A palavra “cabeça”, antigamente, designa a parte superior de um portão ou uma grande porta. O salmista utiliza a palavra no sentido de que os portais sejam abertos ao máximo, pois, aquele que entrará por eles, merece o maior espaço possível, pois, ele é o “Rei da Glória”.
O salmista introduz um responsivo: “Quem é o Rei da Glória?”. Indaga, não porque não o saiba, mas o faz como uma pergunta retórica que dá maior expressividade ao texto. A resposta à pergunta é precisa e eloqüente: “O Senhor, forte e poderoso, o Senhor, poderoso nas batalhas”. As hostes celestiais estão arregimentadas, pois, aquele que foi vitorioso em todas as batalhas retorna a Sião Eterna! Eis o esplendor da chegada de Jesus ao céu! Eis o brilho da entrada do Cristo Vitorioso e Senhor Supremo. Todas as batalhas foram ganhas pelo “Senhor dos Exércitos, o Rei da Glória”. Que batalhas? A maior de todas as batalhas! Aquela em que o maior inimigo de Deus – aquele que separou as criaturas de seu Criador – foi derrotado. O diabo e, conseqüentemente, com ele, a morte e o inferno estão sob cadeias e com elas permanecerão até o dia do julgamento final.
O “Rei da glória” que retorna merece a mais efusiva recepção, pois, ele já instaurou o seu Reino. É com a prerrogativa de que ele é o Rei dos reis e Senhor dos senhores é que começa o “tempo” da igreja. O texto de Lucas diz: “enquanto os abençoava, ia-se retirando deles, sendo elevado para o céu” (Lucas 24.51). Jesus abençoa os seus e neles bendiz a igreja que vai nascer. É feliz saber que a igreja nasceu sob a bênção do seu Senhor. Retirando-se dos seus é elevado ao céu. Essa separação poderia encher os discípulos de grande tristeza, mas, ao contrário, o texto diz que foram “tomados de grande júbilo” (v 52). Não poderia ser de outra forma, pois, agora, seus olhos estavam abertos e souberam quem ele, verdadeiramente, era e creram em seu retorno.
SEU RETORNO
A narrativa da ascensão no livro de Atos, encerra-se com o anúncio: “Varões galileus, por que estais olhando para as alturas? Esse Jesus que dentre vós foi assunto ao céu virá do modo como o vistes subir” (Atos 1.11). A soberania de Jesus, hoje, é pouco conhecida pelo mundo, mas um dia todos serão surpreendidos. Uma trombeta soará e o retorno do Senhor se efetivará. Apocalipse anuncia: “Eis que vem com as nuvens, e todo o olho o verá, até quantos o transpassaram” (Apocalipse 1.7). Se “uma nuvem o encobriu de seus olhos” (Atos 1.9) é uma nuvem que o trará novamente: “e verão o Filho do homem vindo sobre as nuvens, com poder e muita glória” (Mateus 24.30).
A igreja militante que tem combatido o bom combate e sofrido na terra por seu Senhor, não pode esquecer que Jesus lhe deixou uma grande comissão: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado” (João 28.19,20). O recurso com o qual ela pode contar para realizar tal determinação, é o mais valioso: “E eis que estou convosco todos os dias até a consumação do século” (Mateus 28.20). “O Espírito e a noiva dizem: Vem!” (Apocalipse 22.17). Amém.
Texto escrito em 01/06/2005
Escrito por: Erasmo Ungaretti – Janeiro de 1976
Pastor na comunidade de discípulos em Porto Alegre.
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